Mega estruturas de hidrogênio Lyman-Alfa contém os segredos do Universo primordial
Esta
imagem apresenta um dos maiores objetos singulares do Universo, a bolha
de Lyman Alfa LAB-1 (em verde). Crédito: ESO/M. Hayes
Estudos realizados com o suporte do
"Very Large Telescope” (VLT) do Observatório Europeu do Sul (ESO)
permitiram descobrir a fonte de energia de uma enorme nuvem de gás
brilhante do Universo primordial, que os astrônomos chamam de "bolha
Lyman-alfa” (Lyα). As novas medidas mostram de forma inédita que esta
gigantesca "bolha Lyman-alfa”, um dos maiores objetos singulares
conhecidos no Universo, obtém a sua energia a partir das galáxias
residentes no seu interior.
Uma equipe de astrônomos analisou um
incomum objeto cósmico chamado "bolha Lyman-alfa” (Lyα) [1]. Estas
formidáveis estruturas luminosas são geralmente detectadas em regiões do
Universo primitivo, dominado pela gravidade, onde a matéria se
concentra. A equipe constatou que a radiação emanada por uma destas
bolhas é polarizada [2]. A luz polarizada, por exemplo, tem sido usada
em nosso dia-a-dia para criar efeitos 3D no cinema [3]. Como é a
primeira vez que se encontra a polarização em uma "bolha Lyman-alfa”,
esta observação foi considerada importante como ajuda na melhor
compreensão da causa do brilho intenso destas bolhas cósmicas.
Matthew Hayes (Universidade de Toulouse, França), cientista líder do artigo científico que apresenta estes resultados explicou:
"Nós mostramos pela primeira vez que o
brilho destes enigmáticos objetos vem de radiação dispersada, emitida
por galáxias brilhantes escondidas no seu interior, ao contrário do se
pensava o gás espalhado por toda a nuvem que está a brilhar”.
As bolhas de Lyman-α são as maiores estruturas singulares no Universo
As bolhas Lyman-alfa são conhecidas como
um dos maiores objetos existentes no Universo: nuvens gigantes de
hidrogênio gasoso que podem atingir diâmetros da ordem de meio milhão de
anos-luz (5 vezes o diâmetro da nossa galáxia, a Via Láctea) até 200
milhões de anos luz e que são tão energéticas quanto as galáxias mais brilhantes. As bolhas
Lyman-alfa são tipicamente encontradas a grandes distâncias, por isso
nós as vemos tal como se apresentavam quando o Universo era jovem, com
apenas poucos bilhões de anos de idade. Assim, estes objetos são
importantes para a compreensão da formação e evolução das galáxias no
Universo primordial. Até então, a fonte de energia da sua extrema
luminosidade assim como a natureza exata das bolhas era tida como
incerta pelos astrônomos.
A equipe estudou uma das primeiras
bolhas já descobertas e também uma das mais brilhantes. Conhecida pelo
nome de LAB-1, este objeto foi descoberto em 2000 e encontra-se tão
distante que a sua radiação leva cerca de 11,5 bilhões de anos a chegar
até nós. Com um diâmetro de cerca de 300.000 anos-luz, LAB-1 é também
umas das maiores bolhas que temos conhecimento. LAB-1 contém várias
galáxias primordiais no seu interior, incluindo uma galáxia ativa [4].
Existem várias teorias que pretendem
explicar as bolhas Lyman-alfa. Uma delas supõe que estes objetos brilham
quando gás frio é atraído pela gravidade elevada da bolha e
consequentemente aquece. Outra supõe que o brilho se deve a objetos
brilhantes existentes no seu interior: galáxias com formação estelar
elevada, ou que contêm buracos negros que se encontram a atrair matéria.
Estas novas observações mostram que a fonte de energia da LAB-1
deve-se, de fato, a galáxias no seu interior ao invés de gás a ser
atraído e aquecido.
Radiação polarizada surpreende astrônomos
A equipe testou as duas teorias fazendo
medições para saber se a radiação emitida pela bolha se encontrava
polarizada. Ao estudar qual a polarização da radiação, os astrônomos
podem inferir sobre os processos físicos que lhe dão origem, ou saber o
que lhe aconteceu entre a sua emissão e a sua chegada à Terra. Se for
refletida ou dispersada torna-se polarizada e este efeito pode ser
detectado por um instrumento muito sensível. Medir a polarização da
radiação emitida por uma bolha Lyman-alfa é, no entanto, algo bastante
difícil, já que estes objetos se encontram muito distantes de nós.
Claudia Scarlata (Universidade do Minnesota, EUA), co-autora do artigo, esclareceu:
Estas observações nunca poderiam ter
sido feitas sem a ajuda do VLT e do seu instrumento FORS. Precisávamos
claramente de duas coisas: um telescópio com um espelho de, pelo menos,
oito metros de diâmetro de modo a poder coletar radiação suficiente, e
de uma câmara capaz de medir a polarização da radiação. Não existem
muitos observatórios no mundo capazes de oferecer uma tal combinação.
Ao observar o seu alvo ao longo de cerca
de 15 horas com o VLT (Very Large Telescope), a equipe descobriu que a
radiação emitida pela bolha Lyman-alfa LAB-1 estava polarizada em um
anel em torno da região central e que não há polarização no centro. Este
efeito peculiar é praticamente impossível de atingir se a radiação for
emitida apenas pelo gás que está a ser atraído pela bolha devido à
gravidade, mas justamente isto é o que se espera se a radiação tiver
origem em galáxias embebidas na região central, antes de ser dispersada
pelo gás.
Os astrônomos planejam estudar mais
objetos deste tipo para comprovar se os resultados obtidos para a bolha
LAB-1 são válidos para outras bolhas.
Este trabalho foi publicado no artigo científico "Central Powering of the Largest Lyman-alpha Nebula is Revealed by Polarized Radiation” de Hayes et al., publicado na revista Nature de 18 de Agosto de 2011.
A equipe que trabalhou neste estudo foi
composta por Matthew Hayes (Universidade de Toulouse, França e
Observatório de Geneve, Suíça), Claudia Scarlata (Universidade do
Minnesota, EUA) e Brian Siana (Universidade da Califórnia, Riverside,
EUA).
Notas
[1] O nome "bolha de Lyman-alfa”
se originou do fato destas gigantescas bolhas emitirem radiação em um
comprimento de onda característico, conhecido como a radiação
"Lyman-alfa” (Lyα). Esta emissão é produzida quando elétrons
pertencentes aos átomos do hidrogênio migram do segundo nível de energia
para o nível fundamental.
[2] Polarização: quando
as ondas de radiação luminosa estão polarizadas, suas componentes de
campo eléctrico e magnético têm uma orientação específica. Na luz
despolarizada a orientação dos campos é aleatória e não apresenta
nenhuma direção preferencial.
[3] O efeito 3D é
criado para permitir que o olho esquerdo e o direito vejam imagens
ligeiramente diferentes, dandos-nos a sensação da visão tridimensional.
Em alguns cinemas 3D este efeito é obtido através do uso da luz
polarizada: imagens separadas com radiação polarizadas são tratadas por
filtros dispositivos polarizantes existentes nos óculos antes de chegar
aos nossos olhos esquerdo e direito.
[4] Galáxias ativas são
galáxias muito luminosas que contêm violenta atividade nos seus núcleos
provavelmente provocadas pelo buraco negro central supermassivo que se
encontra "em atividade”. A sua intensa luminosidade origina-se do
material super aquecido em queda para o interior do buraco negro.
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