| Como funciona a alquimia das estrelas? A nucleossíntese dos elementos químicos no Universo
A remanescente de supernova G 1.9+0.3, em imagem combinada dos dados de
raios-X, em laranja, pelo Chandra, capturada em 2007, e de rádio
fornecida pela rede de radiotelescópios Very Large Array da NRAO, em
azul, registrada em 1985 . Crédito: www.chandra.harvard.edu
A fabulosa produção de elementos químicos mais pesados em explosões de supernova
é algo que hoje em dia não mais nos surpreende. Mas, exatamente, onde e
quando a nucleossíntese se processa? Isto ainda não está plenamente
claro para nós. Além disso, as tentativas de modelar por computador os
cenários de colapso de núcleo das estrelas ainda desafiam os limites de
capacidade de processamento atuais dos mais poderosos computadores
científicos do mundo.
Nucleossíntese estelar
A nucleossíntese estelar em estrelas de
porte médio ou menores (até 10 massas solares) pode construir alguns
elementos mais leves, tais como o Carbono (C), o nitrogênio, (N), o
Oxigênio (O), o Neônio (Ne) e o Enxofre (S), além, é claro, o Hélio
(He), que por sua vez é produzido em todas as estrelas do Universo,
desde que se formam.
Decaimento Beta
Além disso, a produção de elementos mais
pesados também pode ocorrer quando determinados ‘elementos que atuam
como sementes’ capturam nêutrons para formar novos isótopos. Aqueles
nêutrons capturados poderão a seguir sofrer o decaimento beta (β−)
que transforma estes nêutrons extras em um ou mais prótons. Estes
prótons adicionais resultantes essencialmente significam que se formará
um novo elemento com maior número atômico (o número atômico é quantidade
de número de prótons em um núcleo).
Processo Lento
Mais além, as estrelas massivas, ao
final de suas vidas, quando fora da seqüência principal, conseguem
produzir toda a cadeia de elementos até o Ferro (Fe) e eventualmente
alguns elementos ainda mais pesados, tais como, por exemplo, o Cobre
(Cu), Zinco (Zn) e o Mercúrio (Hg), através do processo-s. Este "processo-lento” ou processo-s (s
de ‘slow’ – ‘lento’ em inglês) de construir elementos mais pesados a
partir do ferro (26 prótons) ocorre em geral nas gigantes vermelhas,
gerando elementos desde o Cobre (Cu), com 29 prótons até mesmo o Tálio
(Tl) com 81 prótons.
Processo Rápido
No entanto, o processo fundamental que
efetivamente gera os demais elementos, compondo praticamente toda a
tabela periódica, é chamado de processo rápido ou processo-r, que acontece em questão de segundos no colapso do núcleo de supernovas
(nos tipos de supernova Ib, Ic e II). Muito mais rápido do que o
processo-s (que atua passo a passo construindo constantemente ao longo
de milhares de anos), os elementos que servem de sementes são
bombardeados massivamente no processo-r por nêutrons livres e ao mesmo
tempo são submetidos a desintegração por raios gama.
Essa combinação frenética de forças e radiação de alta energia consegue
construir uma ampla gama de elementos leves e pesados, nomeadamente
elementos muito mais pesados desde o Chumbo (Pb – 82 prótons) até
Plutônio (Pu – 94 prótons), que jamais serão produzidos pelo lento processo-s.
Na tabela periódica acima vemos os elementos fósseis do Big Bang, o
Hidrogênio (H) e o Hélio (He) em amarelo escuro. O Hélio (He) também é
sintetizado em todas as estrelas no núcleo. Na cor laranja vemos os
elementos formados em estrelas mais leves, quando estas saem da
seqüência principal: Carbono (C), Nitrogênio (N), Oxigênio (O), Neônio
(Ne) e Enxofre (S). As estrelas muito massivas conseguem sintetizar toda
a cadeia até o Ferro (Fe) e alguns elementos mais pesados como o
Mercúrio (Hg), mostrados em amarelo claro. Somente as supernovas
conseguem produzir todos os elementos conhecidos. Além disso, os
elementos brancos acima do Plutônio (Pu) podem ser gerados em um
laboratório, mas estima-se que também se formam naturalmente nas
supernovas. De qualquer forma, em qualquer caso, eles decairiam
rapidamente depois de formados, daí sua difícil detecção no espaço.
Crédito: North Arizona University
Como uma Cebola
Antes da explosão de uma supernova, as reações de fusão em uma estrela massiva
progressivamente são executadas através do processamento do hidrogênio,
primeiro, gerando hélio, depois o hélio gerando carbono/oxigênio.
Camadas de uma estrela massiva prestes a tornar-se uma supernova. Cada
camada está processando a nucleossíntese, exceto o núcleo de Ferro que
permanece estável crescendo até atingir a massa limite de Chandrasekhar.
A seguir formam-se camadas, como uma gigantesca cebola, onde se
realizam a nucleossíntese do carbono, neônio, oxigênio e finalmente o
silício. A partir daí surge o núcleo de ferro, um elemento por demais
estável, que não pode sofre fusão posterior.
O colapso do núcleo de ferro
Progressivamente, quando o núcleo de ferro cresce ao ponto de atingir 1,4 massas solares (conhecido como o limite de Chandrasekhar
), o núcleo não consegue mais suportar a pressão e ocorre o colapso
interno: o núcleo desmorona para dentro de si mesmo a quase um quarto da
velocidade da luz. Diagrama simplificado do cenário do colapso de núcleo estelar: (a)
estrela massiva forma camadas de nucleossíntese dos elementos químicos
em formato de cebola. A camada mais interior de Silício gera o núcleo
estável de Ferro. (b) o núcleo de Ferro atinge o limite máximo de massa
de Chandrasekhar e inicia o colapso, desabando e abrindo um vão dentro
da estrela. (c) O núcleo interior é comprimido em nêutrons e a energia
gravitacional é convertida em neutrinos. (d) Ondas de choque são
formadas e se deslocam para fora do núcleo (vermelho). (e) As ondas de
choque são revigoradas pela enxurrada de neutrinos. (f) Todas as camadas
exteriores são expulsas para o espaço exterior, deixando apenas um
núcleo degenerado de nêutrons, que formará uma 'estrela de nêutrons'.
Este rápido desabamento gera um vão e o
resto da massa estelar tenta preencher o hiato gerado pelo colapso do
núcleo de ferro. Paralelamente o núcleo interno
"salta” novamente para fora devido ao calor produzido pelo colapso
inicial que o faz ‘inchar’. Isso cria uma onda de choque, como um
‘trovão descomunal’, que inicia o processo de explosão da supernova.
Ondas de Choque
Sucessivamente, os golpes das ondas de
choque expulsa as camadas de gás ionizado ao redor da estrela, embora
logo que este material que se expande para o exterior também começa a se
refrigerar. Assim, ainda não está claro se processo-r de nucleossíntese
acontece neste momento.
Mas o colapso do núcleo de ferro ainda
não acabou. A energia gerada com a compressão do núcleo em colapso
desintegra uma enorme quantidade dos núcleos dos átomos de ferro
fragmentando-os em uma pletora de núcleos de hélio e nêutrons livres.
Mais além, os elétrons se fundem com os prótons para formar mais
nêutrons, de modo que o núcleo da estrela, após essa rejeição inicial,
estabelece-se como um estado novo estado da matéria formado de nêutrons
comprimidos, essencialmente uma "proto-estrela de nêutrons”.
Enxurrada de Neutrinos energéticos
Algum tempo depois o novo núcleo de nêutrons é capaz de se estabilizar, devido à liberação de uma enxurrada de energéticos neutrinos que transporta o calor para fora do núcleo.
É este vento expansivo de neutrinos
vento que comanda o resto da explosão. Ele alcança e golpeia as camadas
já ejetadas do exterior da estrela progenitora reaquecendo a matéria em
expansão e adicionando impulso. Os pesquisadores (referências abaixo)
têm proposto que é esse evento de impacto do vento de neutrinos (o
"choque reverso”), que é o responsável pelo processo-r.
Estima-se que o processo-r
em si dura apenas um par de segundos, mas pode ainda demorar uma hora
ou mais para que a frente supersônica de rajadas de explosão cheque até a
superfície da estrela, oferecendo mais algumas contribuições de
elementos pesados nos escombros estelares que comporão a nebulosa
remanescente da supernova.
Fonte
- Universe Today: Astronomy Without A Telescope – Alchemy By Supernova por Steve Nerlich
Artigos científicos
- Nucleosynthesis-relevant conditions in neutrino-driven supernova outflows. II. The reverse shock in two-dimensional simulations. Autores: Arcones A. e Janka H.
- Synthesis of the Elements in Stars, Rev Mod Phy 29 (4): 547. Autores: E. M. Burbidge, G. R. Burbidge, W. A. Fowler e F. Hoyle. (1957).
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